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domingo, 14 de outubro de 2012

PELO RESGATE DA POLÍTICA


A política e o seu exercício é, sem qualquer sombra de dúvida, a principal contribuição do mundo grego para a humanidade. É a partir dos fazeres da política que homens e mulheres se edificam como seres sociais, sociáveis e históricos. 
A formação do homem, a constituição de suas linguagens, a elaboração de seus sinais e códigos, o fazimento de mediações e, enfim, sua própria evolução se dá única e exclusivamente por meio do trabalho, ação consciente e transformadora da natureza em prol da vida humana, mas é a política, política aqui, entendida como dimensão pública, social, comum que garante a formação social. Porque afirma e reafirma o encontro, o aprimoramento e o aperfeiçoamento destes mesmos encontros, das afinidades; Política porque é o modus de humanização do humano, porque, por seu intermédio, o homem aprende a acionar o mundo social da qual é parte ativa e inevitável. 
Negar a política como dimensão totalizante e estruturante do homem em seu infinito estatuto de ser gregário e irremediavelmente pertencente a uma multiplicidade de coletivos e que vive a lhe exigir atualidade, adequação e capacidade de identificação de contextos é lançar, conceitualmente, o próprio homem em uma treva alienante que castra, de forma comprometedora, suas melhores qualidades e valências como fazedor de mundos e futuros individuais e coletivos integrados, possíveis e humanamente densos. 
De outra maneira, a política, possui graciosamente a potência e a fortuna de converter o homem, que outrora se achava atomizado pela miséria, desarticulado do todo social, fraturado de possibilidades e de caminhos para uma profunda virada social, em um homem da mundanidade. Porque é por meio da política que reaprendemos a ver e sentir o mundo, suas coisas e circunstâncias. 
Por isso nasce a utopia, porque reaprendemos a ver o mundo. A utopia é filha legitima da política, da boa política e o homem esvaziado de perspectivas e conteúdos utópicos que motiva e faz caminhar, como poeticamente nos ensina o escritor uruguaio Eduardo Galeano, nega sua própria alma porque, não tem jeito, é do homem sonhar. 
Política, bem mais e maior do que renhidas disputas partidárias é a alternativa para o todo não submeter-se a partes, ao contrário, é a parte ou partes, integradas e que, pela liga da boa política, dão forma, lastro afetivo e histórico para o todo, agora coeso, harmonizado e em permanente mutação pela ação consciente, livre e assentada no bem comum da vida social e que todos temos direitos e deveres. 
Assim, e nesse sentido, fazer política é fiar e tecer utopias, provocar o futuro desejoso, é romper com os encadeamentos mecânicos da vida submersa pelo turbilhão de desumanidades saído da decadente civilização do capital. 
E, definitivamente, não é verdade que “política não se discute”. A verdade é exatamente o inverso, é a política e por meio da política que se estabelece e surge o discurso, que se aprende e apreende o mundo real, dos homens materiais, históricos e concretos, que, pedagogicamente, se altera conteúdos e formas dos problemas e desafios que, não raro, empatam e bloqueiam o livre curso da vida humana.
A política não é discutida em ambientes tirânicos, ditatoriais ou de fundamentalismos medievais onde a fala é roubada, o livre pensar é bloqueado, as boas e vivificantes manifestações da cultura humana são tolhidas, acuadas e lançadas às margens do mundo social, do trabalho e da solidariedade. 
Negar a política é negar o fundamental papel do mundo social no protagonismo e gestão dos seus próprios destinos é, portanto, descambar inexoravelmente, na alienação de entregar a própria vida para influências externas e estranhas. A política é o assumir-se, o reconhecer-se como existência consciente e objetiva e, consequentemente, responsável direta pelo mundo e coisas do mundo. O dramaturgo alemão Bertolt Brecht não erra ao afirmar que o pior analfabeto é o analfabeto político. É que a política é o fundamento que permite e possibilita rearranjos sociais inteligentes, criativos e a serviço do próprio social, portanto, de si mesmo. 
Desse modo, política é o social e seu universo de dinâmicas; É a inventividade, a criação e sua implementação em um permanente interminável; A não-política ou a ausência de política, fim do humano como ser do “com e para o outro”, é o privado, porque quanto mais privado, menos social, menos política e politização. 
Neste paralelo, o contrário da política é o privado. No mundo do privado, todos sabem, a política é cumprir, de forma canina, dogmática e automática as determinações da hierarquia, do dono, proprietário ou mandante. É, portanto, o mobile principal do status quo. Já a política e o seu aperfeiçoamento, sua apropriação por parte das amplas maiorias de homens e mulheres, se vivenciada democrática e adequadamente leva, com o passar do tempo, tempo político, inclusive, a formas novas e próprias de liberação humana. 
De outro modo, é a política levada a estágios mais avançados de aperfeiçoamento a conditio para aquilo que atrevidamente se chama de autogestão ou política plena, dado o seu nível de integridade, unidade e coesão social. É, por fim, o homem, como ser social, realizando suas potencialidades. Pelo resgate da política, sigamos adiante!

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